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PEC das Praias: O Brasil em uma Encruzilhada entre Progresso e Preservação

PEC das Praias: O Brasil em uma Encruzilhada entre Progresso e Preservação

A Proposta de Emenda à Constituição PEC 3/2022, conhecida como PEC das Praias, coloca em discussão a gestão de um dos maiores patrimônios naturais e culturais do Brasil: suas áreas costeiras. A proposta, atualmente em tramitação no Senado, visa transferir os terrenos de marinha da União para estados, municípios ou proprietários privados, extinguindo cobranças como foro e laudêmio. Embora apresente potencial para regularização fundiária e estímulo ao desenvolvimento econômico, também levanta preocupações significativas sobre privatização, exclusão social e degradação ambiental.

O debate em torno da PEC ganhou força em 2024, com ampla polarização entre os defensores, que enxergam uma oportunidade de modernização, e críticos, que alertam para riscos irreversíveis ao acesso público e ao equilíbrio ecológico do litoral brasileiro.

O Caminho da PEC das Praias: Fases de Tramitação e Debate no Senado

A PEC das Praias foi aprovada na Câmara dos Deputados em 2022, com apoio de parlamentares alinhados à descentralização da gestão de terras públicas. Desde então, o texto tem enfrentado resistência e apoio no Senado, onde atualmente está em análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Em dezembro de 2024, a PEC foi pautada para votação na CCJ, com expectativa de avanços para o plenário. Caso aprovada, será submetida a dois turnos de votação no Senado, exigindo o apoio de pelo menos 49 dos 81 senadores. Se aprovada no Senado, será promulgada como parte da Constituição Federal, alterando de forma definitiva o status dos terrenos de marinha.

O relator da proposta na CCJ, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), defende a medida como um passo necessário para solucionar problemas históricos de regularização fundiária. No entanto, entidades ambientalistas e o próprio governo federal têm se posicionado contra, argumentando que a PEC pode causar impactos sociais e ambientais irreparáveis.

Impactos Potenciais: Regiões que Podem Evoluir e Áreas Vulneráveis

A PEC das Praias apresenta implicações distintas dependendo da realidade socioeconômica e ambiental das regiões afetadas.

Regiões que podem evoluir:
Áreas urbanizadas e turísticas, como Balneário Camboriú (SC) e Florianópolis (SC), são vistas como exemplos de regiões que poderiam se beneficiar com a medida. Nessas localidades, a transferência de terrenos de marinha para a gestão local poderia facilitar investimentos em infraestrutura turística, aumentando a arrecadação e melhorando a qualidade dos serviços oferecidos à população e aos visitantes.

Áreas vulneráveis e em risco:
Em contrapartida, regiões com maior dependência do uso público das praias ou que abrigam comunidades tradicionais podem sofrer impactos negativos severos. No Litoral Norte de São Paulo, cidades como Caraguatatuba, São Sebastião, Ubatuba, Ilhabela e até mesmo áreas periféricas como Boracéia estão entre as mais sensíveis.

Essas localidades dependem de um modelo de turismo sustentável e inclusivo, onde o acesso público às praias é essencial para atrair visitantes e sustentar atividades econômicas como a pesca artesanal e o comércio local. A privatização de áreas costeiras pode levar à especulação imobiliária, restringindo o acesso e excluindo moradores e turistas que não podem arcar com custos elevados.

Riscos ao Uso Público das Praias

Os defensores da PEC garantem que o texto preservará o acesso público às praias. Contudo, a experiência brasileira com privatizações levanta dúvidas sobre a eficácia dessa proteção. Atualmente, a Constituição garante que as praias são bens de uso comum, mas a transferência de terrenos de marinha para a gestão privada pode enfraquecer essa garantia, sobretudo em áreas onde o poder público local não tem estrutura para fiscalizar abusos.

Um exemplo prático dos riscos pode ser observado em praias onde empreendimentos privados já tentaram restringir o acesso, como na Praia do Bonete, em Ilhabela, e na Praia de Juquehy, em São Sebastião. A PEC pode facilitar o aumento de conflitos semelhantes, com donos de terrenos controlando o acesso de forma velada ou explícita, transformando praias em áreas exclusivas.

Além disso, áreas ambientalmente sensíveis, como manguezais e restingas no Litoral Norte, poderiam ser ameaçadas por novos empreendimentos imobiliários que desrespeitem diretrizes de preservação. Essas áreas são cruciais para o equilíbrio ecológico, atuando como barreiras naturais contra mudanças climáticas e erosão costeira.

Como a PEC pode impactar o Litoral Norte de São Paulo

O Litoral Norte de São Paulo, que abrange Caraguatatuba, São Sebastião, Ubatuba, Ilhabela e Boracéia, é uma das regiões mais valorizadas do estado, tanto pelo turismo quanto pela biodiversidade.

  • Caraguatatuba:
    Como uma das cidades mais urbanizadas da região, Caraguatatuba poderia experimentar um aumento de arrecadação com a transferência de terrenos de marinha. Contudo, a expansão imobiliária pode trazer novos desafios para a infraestrutura e o uso público das praias.
  • São Sebastião:
    Em áreas como Maresias e Juquehy, conhecidas por atrair turismo de alto padrão, há o risco de exclusão social e elitização dos espaços. As comunidades locais podem enfrentar dificuldades para acessar áreas que sempre foram públicas.
  • Ubatuba:
    Com uma forte presença de comunidades caiçaras, a cidade depende do uso irrestrito das praias para a pesca artesanal e o turismo sustentável. A PEC pode colocar em risco práticas culturais e econômicas tradicionais, além de afetar a rica biodiversidade da região.
  • Ilhabela:
    Em praias mais isoladas, como Bonete e Castelhanos, o acesso já é um desafio. Com a possível privatização de áreas adjacentes, o controle de entrada pode se tornar ainda mais rígido, prejudicando moradores e turistas.
  • Boracéia:
    Situada entre São Sebastião e Bertioga, Boracéia abriga uma população que depende de um modelo acessível de turismo e comércio. A PEC pode trazer impactos desproporcionais, reduzindo a acessibilidade para os moradores mais vulneráveis.

Um Passo Perigoso para o Patrimônio Nacional

A PEC das Praias coloca o Brasil diante de um dilema que vai muito além da gestão fundiária. O que está em jogo é o equilíbrio entre progresso econômico e preservação do patrimônio natural e cultural do país.

Embora seja importante resolver os entraves fundiários que prejudicam milhares de famílias, a transferência de terrenos de marinha para a iniciativa privada traz mais riscos do que benefícios. A privatização de praias pode reforçar desigualdades sociais, transformando espaços historicamente acessíveis em áreas exclusivas para poucos.

Além disso, confiar que estados e municípios serão capazes de gerir essas áreas com responsabilidade ambiental é uma aposta arriscada. Muitos governos locais carecem de estrutura para fiscalizar abusos ou garantir a preservação ambiental, especialmente em regiões onde o interesse econômico predomina sobre as políticas públicas.

Cidades como Caraguatatuba e São Sebastião têm muito a ganhar com investimentos, mas isso não pode ser feito à custa da exclusão de moradores e da destruição de áreas protegidas. Por outro lado, Ubatuba, Ilhabela e Boracéia correm o risco de perder sua essência, transformando-se em símbolos de como a ganância pode superar o interesse coletivo.

O Brasil precisa decidir se suas praias continuarão sendo espaços de integração e lazer para todos ou se se tornarão territórios de exclusão e exploração. Este é um momento crítico que exigirá uma análise cuidadosa e a coragem de priorizar o que é realmente importante: o acesso democrático e a preservação de um patrimônio que pertence a todos.

A PEC das Praias representa uma das propostas mais controversas e impactantes em discussão no Brasil nos últimos anos. Ela não apenas busca resolver um problema histórico de regularização fundiária, mas também redefine como a sociedade brasileira enxerga e utiliza um de seus maiores patrimônios naturais: o litoral. No entanto, enquanto os benefícios potenciais são amplamente divulgados, os riscos que ela traz exigem um debate muito mais profundo e responsável.

Para as cidades do Litoral Norte de São Paulo, como Caraguatatuba, São Sebastião, Ubatuba, Ilhabela e Boracéia, a aprovação da PEC poderia significar tanto oportunidades quanto ameaças. Por um lado, o aumento de arrecadação e a regularização de áreas poderiam trazer mais investimentos e melhorias em infraestrutura. Por outro, há o risco real de que praias e áreas costeiras se tornem exclusivas, restringindo o acesso de comunidades tradicionais e prejudicando o turismo sustentável que é a base econômica da região.

O Brasil enfrenta um momento decisivo. A aprovação da PEC sem regulamentações rígidas e transparência pode abrir precedentes perigosos para outras áreas de uso público no país. Por isso, é essencial que o Senado, ao analisar a proposta, estabeleça salvaguardas claras que preservem o direito de acesso público às praias, protejam ecossistemas costeiros e garantam a inclusão social e econômica das populações mais vulneráveis.

Além disso, a sociedade civil e os governos locais precisam estar atentos para assegurar que essas mudanças sejam conduzidas de maneira justa e equilibrada. Qualquer decisão sobre o uso do litoral brasileiro deve considerar o impacto para as futuras gerações, priorizando a preservação ambiental, o direito coletivo e a manutenção das tradições culturais que fazem parte da identidade do país.

Mais do que uma questão política ou econômica, a PEC das Praias é um teste para os valores que o Brasil deseja preservar. A escolha entre progresso e preservação não precisa ser excludente, mas isso dependerá da coragem de legislar com responsabilidade e de manter um diálogo constante com todos os segmentos da sociedade. O futuro das praias brasileiras, e o que elas simbolizam para o povo, será definido pelas escolhas feitas agora. Que elas sejam feitas com a consciência de que o litoral é um bem de todos e não de poucos.

Opinião – por Leandro Côelho

A PEC das Praias é um divisor de águas, mas não no sentido positivo. Ela escancara a forma como os interesses privados e a ganância podem se sobrepor ao bem coletivo, ao meio ambiente e à identidade cultural de um país. Sob o pretexto de resolver pendências fundiárias e descentralizar a gestão, a proposta tem potencial para transformar o que é de todos em propriedade de poucos. Isso não é progresso; é retrocesso mascarado de modernidade.

Moradores da praia dos Amores, em Caiobá, quiseram restringir acesso ao público e Prefeitura de Matinhos teve de intervir | foto: Gil Cordeiro / Gazeta do Povo

Os defensores da PEC prometem desenvolvimento, mas quem realmente vai lucrar? Grandes empresários? Investidores especulativos? Enquanto isso, comunidades tradicionais, como as de Ubatuba, Ilhabela, Boracéia e São Sebastião, que dependem do acesso irrestrito às praias para sobreviver, correm o risco de serem empurradas ainda mais para as margens, não apenas geográficas, mas sociais. As praias, símbolos de liberdade e pertencimento, podem se tornar territórios de exclusão, onde apenas aqueles que podem pagar terão o privilégio de entrar.

E o que dizer da destruição ambiental? Manguezais, restingas, áreas de proteção natural – tudo isso pode ser sacrificado em nome de resorts, condomínios de luxo e especulação imobiliária. O discurso de desenvolvimento econômico cai por terra quando o preço a pagar é a degradação de ecossistemas cruciais e a perda de identidade de regiões inteiras. Será que vale a pena transformar paraísos naturais em produtos embalados para consumo de uma elite?

O Litoral Norte de São Paulo, com suas cidades icônicas como Caraguatatuba, São Sebastião e Ilhabela, está na linha de frente desse embate. Essas comunidades, que têm na simplicidade e na conexão com a natureza sua essência, não podem ser transformadas em reféns de uma lógica de mercado que vê terra apenas como um ativo. Se as praias se tornarem exclusivas, se o acesso público for comprometido, o que restará do turismo inclusivo e da convivência democrática que definem esses lugares?

A PEC das Praias é um alerta. Não se trata apenas de terras ou praias, mas de uma escolha de valores. Estamos dispostos a vender o que é coletivo em nome de uma promessa de progresso que beneficia poucos? Estamos preparados para ver nossas praias, que sempre simbolizaram liberdade, cercadas por muros invisíveis e placas de “propriedade privada”? Essa não é apenas uma questão política; é uma luta pela alma do Brasil.

Se o Senado ceder à pressão e aprovar essa PEC sem regulamentações rígidas e garantias claras de acesso público, será um atestado de que o lucro se tornou mais importante do que as pessoas, o meio ambiente e o futuro. Essa é uma batalha que não podemos perder. O litoral brasileiro não pertence a um grupo seleto. Ele é do povo. Sempre foi. E deve continuar sendo.

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